
Geologia da ilha de São Miguel
Caracterização geológica
A ilha de São Miguel é a maior do arquipélago, apresentando um comprimento máximo de 66 km e uma largura de 16 km, com uma área de 747 km2.
A ilha inclui seis unidades vulcanoestratigráficas: Complexo Vulcânico do Nordeste, Complexo Vulcânico da Povoação, Complexo Vulcânico das Furnas, Complexo Vulcânico das Sete Cidades, Complexo Vulcânico do Fogo e Complexo Vulcânico dos Picos.
A ilha terá assim resultado da junção da ilha primitiva, constituída pelos Complexos Vulcânicos do Nordeste, Povoação, Furnas e Fogo, com a "ilha" do Complexo Vulcânico das Sete Cidades.
Complexo Vulcânico do Nordeste (4,01 a 0,95 milhões de anos)
O Complexo Vulcânico do Nordeste, localizado na extremidade oriental de São Miguel, é considerado a unidade vulcanoestratigráfica mais antiga da ilha. Este complexo, essencialmente constituído por escoadas lávicas, corresponde a uma região montanhosa com imponentes arribas e profundos vales de erosão (Queiroz, 1990), podendo ser observados ao longo da costa inúmeros filões (Forjaz, 1997). Este complexo apresenta uma sequência estratigráfica em que os basaltos transacionais, com cerca de 4.01 Ma, correspondem às rochas mais antigas, a que se sucedem ankaramitos, basaltos, traquibasaltos, tristanitos e traquitos, estes últimos com 0.95 Ma (Carvalho, 1999). Estes elementos permitem interpretar que há cerca de 4 Ma se instalou nesta região um aparelho vulcânico, em forma de escudo, de natureza basáltica. Este edifício, após um período de repouso, continuou a crescer mantendo as mesmas características basálticas. A sua atividade terminou com derrames e injeções de lavas tristaníticas e traquíticas. Cessada a atividade, a paisagem entrou num período de desgaste e erosão, dela restando apenas uma parte deste vasto vulcão (Forjaz, 1997).
Complexo Vulcânico da Povoação (3,2 milhões de anos a 650 mil anos)
O Complexo Vulcânico da Povoação compreende um estratovulcão com caldeira, cuja vertente sul se encontra totalmente destruída na sequência de fenómenos de colapso e erosão (Carvalho, 1999). A coluna estratigráfica deste complexo assenta sobre os mantos lávicos do Complexo Vulcânico do Nordeste, sendo constituída essencialmente por produtos lávicos e vulcaniclástos no topo dos quais se encontram depósitos associados ao desenvolvimento do Vulcão das Furnas (Amaral, 2005). Estima-se que o Complexo Vulcânico da Povoação tenha surgido há cerca de 3.2 Ma, quando o vulcão do Nordeste se aproximava das suas fases intermédias. Nas fase iniciais os produtos emitidos foram essencialmente de natureza basáltica, evoluindo para traquíticas. Após um período de repouso, iniciou-se a construção da vasta caldeira. Posteriormente, instalaram-se diversos aparelhos secundários, quer no interior da caldeira, quer nas vertentes exteriores. Admite-se que a atividade vulcânica tenha terminado, por falta de alimentação da câmara magmática, há cerca de 650 mil anos (Forjaz, 1997).
Complexo Vulcânico das Furnas (1 milão de anos até ao presente)
O Complexo Vulcânico das Furnas consiste num estratovulcão, no topo do qual se encontra um complexo de caldeiras. A coluna vulcanoestratigráfica é constituída, por ordem decrescente de idades, por depósitos de lapilli pomítico, escoadas lávicas, tufos, ignimbritos e alternância de cinzas e lapilli pomíticos (Guest et al., 1994). As formações mais antigas têm idades compreendidas entre 0.75 e 1 Ma, As primeiras emissões deste vulcão foram de natureza basáltica. O vulcão desenvolveu-se rapidamente, passando de episódios basálticos para erupções traquíticas, onde predominaram as de estilo pliniano (Forjaz, 1997). A caldeira resultou de uma sequência de importantes episódios de colapso. Posteriormente ocorreram várias erupções plinianas algumas das quais deram origem a duas crateras, uma onde se encontra atualmente o lugar das Furnas e outra onde se encontra a Lagoa das Furna (França et al., 2003). Estas erupções deram ainda origem a vários anéis de pedra-pomes associados a domos traquíticos (Carvalho, 1999). A última erupção ocorreu em 1630 (França et al., 2003).
Complexo Vulcânico das Sete Cidades (290 mil anos até ao presente)
O Complexo Vulcânico das Sete Cidades compreende o estratovulcão das Sete Cidades, estrutura com caldeira, domos e cones de escórias e pedra-pomes (Queiroz, 1990). A coluna estratigráfica apresenta uma espessa sequência de escoadas lávicas e depósitos vulcanicláticos e vários tipos de depósitos piroclásticos de queda e de fluxo, bem como por um menor volume de escoadas lávicas emitidos. As raízes do estratovulcão das Sete Cidades surgiram a cerca de 15 milhas a leste dos anteriores, há cerca de 290 mil anos. Durante a fase de crescimento predominaram as manifestações explosivas com emissão de pedra-pomes e ignimbritos (Forjaz, 1997). A formação da caldeira ocorreu em três fases distintas, respetivamente, há cerca de 36000, 29000 e 16000 anos (Queiroz, 1997). Nas vertentes exteriores do estratovulcão e no interior da caldeira ocorreram erupções vulcânicas (Forjaz, 1997). A última erupção ocorreu na Caldeira Seca há, provavelmente, 700 anos (França et al., 2003).
Complexo Vulcânico do Fogo (181 mil anos até ao presente)
O Complexo Vulcânico do Fogo compreende o imponente estratovulcão do Fogo, estrutura com caldeira, domos e diversos cones adventícios (Queiroz, 1990). Os materiais mais antigos deste vulcão são de natureza basáltica e foram evoluindo ao longo de diversos episódios para fáceis traquíticas (Forjaz, 1997). Para a formação da caldeira foram identificados dois eventos eruptivos: o primeiro ocorreu num período compreendido entre 46500 e 26500 anos atrás e o segundo ocorreu nos últimos 15000 anos (Wallenstein, 1999). A última erupção ocorreu 1564 (França et al., 2003).
Complexo Vulcânico dos Picos (Presente)
Apresenta-se com um vulcanismo basáltico, do tipo fissural, evidenciado pela distribuição de numerosos cones de escórias. A atividade vulcânica foi essencialmente do tipo havaiano e estromboliano, encontrando-se também estruturas típicas da atividade surtseiano (França et al., 2003). A maior parte dos cones e escoadas deste complexo terão idade Holocénica (Moore, 1990).
Referências
Amaral, P. A. P. (2005). Monitorização de vertentes instáveis no concelho da Povoação, ilha de São Miguel (Açores): Ensaios com base na utilização de uma estação total. Dissertação para a obtenção do grau Mestre em Vulcanologia e Riscos Geológicos, Universidade dos Açores. Ponta Delgada.
Carvalho, M.R.E. (1999). Hidrogeologia do Maciço Vulcânico de Água de Pau/Fogo (São Miguel - Açores). Dissertação para a obtenção do grau de Doutor em Geologia, Universidade dos Açores. Ponta Delgada.
França, Z.; Cruz, J. V.; Nunes, J. C. e Forjaz, V. H. (2003). Geologia dos Açores: Uma perspectiva actual. Açoreana. Ponta Delgada.
Forjaz, V. H. (1997). Alguns vulcões da ilha de São Miguel. I Parte.Observatório Vulcanológico e Geotérmico dos Açores. 3ª ed. Ponta Delgada.
Forjaz, V. H. (2004). Atlas básico dos Açores. OVGA - Observatório Vulcanológico e Geotérmico dos Açores. (Ed.). 112-140. Ponta Delgada.
Guest, J.E.; Duncan, A.M.; Cole, P.D.; Gaspar, J.L.; Queiroz, G.; Wallenstein, N. e Ferreira, T. (1994). Preliminary report on the volcanic geology of Furnas volcano. ESF Furnas Laboratory Volcano, Open-File Report 1, 24 pp. Ponta Delgada.
Moore R.B. (1990). Volcanic geology and eruption frequency, São Miguel, Azores. Bull. Volcanol., 52: 602-614.
Queiroz, G. (1990). Aspectos vulcanológicos do Maciço das Sete Cidades. Provas de Progressão na Carreira de Investigação, Centro de Vulcanologia, INIC, Ponta Delgada.
Queiroz, G. (1997). Vulcão das Sete Cidades (S. Miguel Açores): História eruptiva e avaliação do hazard. Dissertação para a obtenção do grau de Doutor em Geologia, Universidade dos Açores, Ponta Delgada.
Wallesnstein, N., 1999. Estudo da história recente e do comportamento eruptivo do Vulcão do Fogo (S.Miguel, Açores): avaliação preliminar do hazard. Dissertação para a obtenção do grau de Doutor em Geologia, 266 pp. Univiversidade dos Açores. Ponta Delgada